Uso e escolha de binóculos para observações astronómicas


Introdução

A utilização de binóculos nas observações astronómicas pode inicialmente fazer sorrir algumas pessoas, mas estes aparelhos têm muito para oferecer a troco de um custo relativamente acessível. Quando devidamente utilizados podem chegar a surpreender-nos e as opiniões mais cépticas alteram-se rapidamente. De facto, um binóculo reúne cumulativamente diversas vantagens não desprezáveis:
  • bom poder de captação de luz;
  • campo visual razoavelmente extenso;
  • custo relativamente acessível;
  • possibilidade de utilizar simultaneamente os dois olhos;
  • pequenas dimensões e pouco peso.


Estas características fazem de um binóculo um instrumento de observação extremamente portátil e muito útil, recurso magnífico para quem não possui telescópio e complemento indispensável para quem já o tiver. A amplificação de um binóculo (muitas vezes chamada "ampliação") é perfeitamente suficiente, e por vezes ideal, para empreender diversas observações astronómicas. Estes aparelhos podem proporcionar-nos uma visão do céu muito interessante e a sua robustez e extrema facilidade de utilização permitem que até uma criança explore com eles o céu nocturno (não será demais relembrar que nunca se deve apontar um binóculo para o Sol).

Não se deve varrer o céu aleatoriamente com o binóculo, embora isso possa ser ocasionalmente interessante. Para que a observação seja proveitosa, é indispensável saber para onde se olha: é preciso conhecer já várias constelações e saber utilizar mapas celestes, pois só assim saberemos onde encontrar os alvos mais interessantes. A aprendizagem do céu deve, por isso, começar pelas observações a olho nu.

Para preservar a facilidade e comodidade das observações não se deve escolher um binóculo com ampliação exagerada. Se esta for superior a 10x, o tremor das mãos torna a observação desconfortável, cansativa e mais difícil. Este problema, tanto mais incomodativo quanto maior for a ampliação e o peso do aparelho, evita-se montando o binóculo num tripé firme. Há acessórios adaptadores que permitem montar os binóculos nos tripés utilizados para as máquinas fotográficas, o que é sempre vantajoso (com qualquer ampliação, mesmo pequena) nas observações minuciosas ou demoradas, ou quando se quer mostrar algo a uma pessoa que não consiga apontar o binóculo para um alvo astronómico menos óbvio. Este acessório é também muito útil quando se pretende levar um grupo de pessoas a fazer sucessivamente a mesma observação, pois o campo visual amplo permite manter o binóculo apontado durante algum tempo para o mesmo alvo. As decepções só surgem quando se espera de um binóculo aquilo que só um telescópio pode dar. Por isso, um binóculo deve ser sempre utilizado dentro dos seus limites, que convém conhecer, de modo a não criar expectativas irrealistas. A capacidade para interpretar o que se vê melhora, e muito, com o treino.

Principais características a considerar

Abertura e ampliação

Normalmente os binóculos têm gravada uma indicação que se apresenta como um produto de dois números. Se lá estiver, por exemplo, "8x40" isso significa que as objectivas têm 40 mm de diâmetro útil e que a ampliação é 8x (ao diâmetro útil das objectivas chama-se abertura do binóculo). As aberturas escalonam-se normalmente entre os 20 mm (nos binóculos-miniatura) e os 80 mm nos binóculos grandes (pesados e muito mais caros), embora os haja ainda maiores. Consoante os modelos, as ampliações disponíveis estão na maior parte dos casos compreendidas entre as 7x e as 20x. Pelas razões já referidas convém que nos limitemos às ampliações entre 7 e 10 vezes. Quanto à abertura, as suas vantagens são óbvias: é pela objectiva que entra toda a luz captada pelo binóculo. Por isso, quanto maior for o seu diâmetro mais luminosa será a imagem do objecto observado, para uma dada ampliação.

Os modelos de pequena abertura (< 30 mm) servem apenas para as observações diurnas em locais bem iluminados (acontecimentos desportivos, paisagens, etc.). Não se recomendam para as observações astronómicas, embora ainda sejam uma grande ajuda, se não tivermos outros (v. quadro 1). Os de 80 mm de abertura (de preferência 11x80) são excelentes para Astronomia, embora tenham um preço elevado e exijam um tripé firme, devido ao peso já considerável. Se pretendemos um binóculo que preencha o melhor possível o compromisso entre preço, tamanho, peso e possibilidades de observação, as melhores escolhas são os modelos 7x50, 8x40 ou 10x50, como iremos justificar.

Evitem-se os binóculos com zoom, por exemplo 7-21x50 (ampliação variável entre 7x e 21x), pois têm geralmente um campo visual mais estreito.

Poder de captação de luz

O diâmetro das pupilas dos olhos de um indivíduo jovem, na obscuridade, aumenta até atingir cerca de 7 mm. Uma objectiva de 40 mm de diâmetro, por exemplo, tem uma área (40/7)2=32,7 vezes superior à da pupila do olho e, portanto, receberá do astro observado um fluxo luminoso 32,7 vezes maior do que aquele que recebemos a olho nu. Neste sentido, o binóculo pode ser visto como um funil que colecta fotões e os conduz para os nossos olhos. Este binóculo "aumenta" 32,7 vezes o brilho com que vemos as estrelas e podemos dizer que tem um poder de captação de luz de "32,7 olhos". Desprezámos aqui as perdas por absorção da luz nos vidros e por reflexão nas superfícies ar-vidro, actualmente minimizadas pela utilização de bons vidros ópticos e de tratamentos anti-reflexo. As lentes com tratamento anti-reflexo ("coated", ou, melhor ainda, "multicoated") mostram uma tonalidade entre o azul e o roxo) e os melhores prismas são em vidro óptico de grande qualidade (BaK-4).

No entanto, ao considerar um binóculo de maior abertura (e consequentemente com maior poder de captação de luz) verifica-se que o peso e o preço também crescem no mesmo sentido, variando o segundo ainda mais depressa que o primeiro. Por isso, a escolha mais equilibrada recai numa abertura de 50 mm (poder de captação de luz = "51 olhos"). Um binóculo com objectivas de 80 mm de diâmetro ("131 olhos") tem um preço cinco a seis vezes superior, ultrapassando já os 400 euros, e os seus 2 kg cansam os braços, impondo o uso de um tripé sólido. Mais caros ainda, a preços praticamente inacessíveis, também se fabricam binóculos de utilização mais especializada (14x100, 20x125 e 25x150). Foi com um superbinóculo deste último tipo, montado sobre um pedestal, que Yuji Hyakutake descobriu o cometa que recebeu o seu nome.

Devido ao poder de captação de luz dos binóculos, as estrelas observadas através deles aparecem muito mais brilhantes e em número muitíssimo maior do que a olho nu, embora se continuem a ver como pontos luminosos (independentemente da ampliação utilizada). Num local excelente, um binóculo de 40 mm de abertura permite detectar estrelas de magnitude 9,8; num mau local permite visualizar estrelas 3,8 magnitudes mais fracas do que as que estão no limite de visibilidade a olho nu, nesse mesmo local. Por outras palavras: o binóculo é sempre um bom auxílio visual. E convém saber que, se a abertura for a mesma, um telescópio não mostrará mais estrelas do que um binóculo.

No que se refere à observação de objectos pontuais, como é o caso das estrelas, a luz não se espalha, consoante a ampliação, por uma área maior ou menor na retina e, portanto, a aptidão de um binóculo para as tornar visíveis depende exclusivamente da sua abertura. Porém, esta é, o factor que mais contribui para o peso de um binóculo. O quadro seguinte dá uma ideia aproximada do que se pode esperar, referindo ainda outras informações úteis.

Quadro 1. Algumas características dos binóculos, de acordo com a sua abertura
Abertura/mmCaptação de luz (1)Magnitude-limite (2)Massa/kg (3)
 
208,28,30,2
3018,49,20,5
4032,79,80,6
5051,010,31,0
6073,510,71,4
80130,611,32,2
100204,111,84,0

(1) Em relação ao olho humano adaptado à obscuridade (olho=1), com pupila de 7 mm de diâmetro.
(2) Magnitude das estrelas mais débeis observáveis num local excelente (sem ajuda óptica esse limite corresponde à magnitude 6). Num local apenas suficiente convém subtrair 2 magnitudes aos valores desta coluna para chegar a uma previsão realista.
(3) Valores médios.


Significado e consequências da ampliação

Em rigor deve-se dizer "amplificação angular", mas no comércio de binóculos diz-se "ampliação". Por isso empregaremos este último termo, para evitar futuras confusões. Uma ampliação de 8x, por exemplo, pode ser interpretada de duas maneiras diferentes, equivalentes para os nossos propósitos:

a) os objectos observados serão vistos como se estivessem 8 vezes mais próximos;
b) duas estrelas separadas uma da outra por uma distância angular de, por exemplo, 0,2º serão vistas-através este binóculo-como se estivessem a 8x0,2º=1,6º uma da outra: aparecerão, portanto, mais espaçadas quando vistas com o binóculo do que à vista desarmada.



Como consequência disto, as trepidações que imprimirmos a este binóculo, quando o seguramos, serão também ampliadas oito vezes (e, como se sabe, há pessoas que tremem mais do que outras). Os bons binóculos de 20x, caros, de campo mais estreito e utilização mais difícil, não são aconselhados para a iniciação.

Por vezes encontram-se à venda binóculos de grande ampliação (por exemplo 20x50 e até mesmo 30x50), a preços tentadores. São geralmente armadilhas que convém rejeitar firmemente: a qualidade óptica é baixa e o campo visual é muito estreito.

Campo visual

Além da indicação numérica já referida (por exemplo 7x50), alguns binóculos trazem também a indicação do diâmetro do seu campo visual, geralmente sob a designação inglesa (field). Em primeira aproximação, quanto maior for a ampliação menos extenso será o campo visual. Para a utilização dos binóculos nas observações astronómicas, a indicação do campo em graus (campo angular) é a mais útil. Embora alguns fabricantes procedam assim, outros preferem apresentar o campo linear, mais informativo para as observações terrestres, mencionando a extensão (em metros), perpendicular à linha de visão, de uma paisagem observada à distância de 1000 m (por exemplo 105 m/1000 m); outros ainda, sobretudo nos binóculos de fabrico americano, indicam a extensão (em pés) do campo observável a uma distância de 1000 jardas (por exemplo 367 ft/1000 yd). É fácil converter entre si estes modos de indicar o diâmetro do campo visual:





Assim, para servir de exemplo, um campo visual de 122,5 m/1000 m = 7,0º e um de 262,5 ft/1000 yd = 5,0º. Um campo visual mais extenso implica geralmente menor ampliação, mas permite ver mais estrelas simultaneamente, o que dará uma visão mais interessante dos campos de estrelas. Tipicamente, nos modelos normais, um binóculo de 7x abarca um campo de cerca de 7º, um de 10x abrange 6º e um de 20x apenas 3,5º. Há pequenas variações nestes valores de acordo com o tipo de oculares que os binóculos têm: os que possuem oculares de campo extenso (wide field), podem abarcar maior campo visual do que os binóculos normais com idêntica ampliação. A título de comparação, num pequeno telescópio, com uma ampliação média, teremos um campo de cerca de 0,3º.

Interacção olho-binóculo

A pupila de saída e o olho

Toda a luz que entra pelas objectivas tem de chegar à retina dos nossos olhos, caso contrário estaremos a desperdiçar parte da luz admitida pela objectiva. Após atravessar todo o sistema óptico do binóculo, e antes de chegar ao olho do observador, o diâmetro do feixe luminoso passa por um mínimo (na chamada pupila de saída) que não deverá nunca exceder o da pupila do olho, para que o globo ocular receba toda a luz captada pela objectiva (na observação, a posição da pupila do olho coincide praticamente com a da pupila de saída do binóculo. À pupila do olho também se chama pupila ocular.

O diâmetro da pupila de saída é fácil de calcular: basta dividir o diâmetro da objectiva pela ampliação. Num binóculo 10x50, por exemplo, a pupila de saída terá o diâmetro de 50 mm/10=5 mm). Se um binóculo tiver maior ampliação do que outro (e objectivas do mesmo diâmetro) a mesma luz, captada por exemplo de uma galáxia ou de uma nebulosa, espraia-se por uma área maior na retina, originando uma imagem que, embora maior, é menos luminosa. Com menor ampliação a imagem será mais luminosa, mas a ampliação não pode, para uma dada abertura, vir abaixo de um certo valor: se a ampliação for demasiado baixa, a pupila de saída ficará maior que a pupila do olho e não aproveitaremos toda a luz captada pelas objectivas. Como a pupila ocular adaptada à escuridão (num indivíduo jovem) atinge cerca de 7 mm de diâmetro, na observação astronómica a pupila de saída do binóculo não deverá exceder esses 7 mm. Portanto, a ampliação não deverá ser inferior ao quociente do diâmetro da objectiva por 7. Se a abertura for de 40 mm a ampliação não deverá ser inferior a cerca de 6x (pois 40/7=5,7) e um binóculo com abertura de 50 mm não deverá ter ampliação inferior a 7x (visto que 50/7=7,1).

Para a observação astronómica de objectos extensos (nebulosas e galáxias), a pupila de saída deverá ter, portanto, um diâmetro próximo dos 7 mm (entre 5 e 7 mm). Porém, o peso da idade também se faz sentir neste domínio: quando chegamos aos 40 anos, o diâmetro da pupila do olho não excede 6 mm, e aos 55 anos fica-se pelos 5 mm. Por isso, a idade do observador também é um elemento a ter em conta na escolha dos binóculos. Um 7x50 é excelente para quem tiver menos de 20 anos. Com esse mesmo aparelho, um cinquentão só aproveitará a luz que entra pela parte central das objectivas, num diâmetro de 35 mm, embora estas continuem a ter os mesmos 50 mm: verá o mesmo que com um 7x35 (mais leve e menos dispendioso). Para captar mais luz, este último observador poderá utilizar um 8x40 ou um 10x50 (ambos com pupilas de saída de 5 mm).

A pupila de saída de um binóculo vê-se e mede-se facilmente: volta-se o aparelho, de dia, para o céu (sem o apontar para o Sol). Pega-se num pedaço de papel vegetal (5 cmx5 cm), que se leva até cerca de 1,5 cm de uma das oculares, tendo o cuidado de o manter aproximadamente perpendicular ao eixo óptico. Deslocando o papel vegetal um pouco para trás e para diante, lentamente, encontraremos uma posição em que se vê, projectado no papel, um pequeno círculo iluminado, com o contorno nítido e com o diâmetro mínimo: é a pupila de saída. Ela vê-se melhor através do papel (por isso optámos pelo papel vegetal). É também possível medir o afastamento da pupila de saída (distância entre a última superfície óptica, visível, das oculares e a pupila de saída). Esta distância é da ordem dos 13 a 26 mm, consoante os binóculos utilizados; as pupilas de saída mais afastadas tornam a observação mais cómoda e permitem a observação com óculos.

Adaptação à distância interpupilar do utilizador

Todos os binóculos possuem uma articulação central que permite fazer variar a distância entre as oculares, adaptando-se a todas as pessoas de acordo com as diversas distâncias interpupilares. Ao pegar nos binóculos, e depois de os focar, deveremos fazer variar essa distância de modo a corresponder à nossa. Não nos preocupemos com o rigor: essa distância estará bem acertada quando conseguirmos fundir sem esforço as duas imagens numa só, deixando de "ver em duplicado".

Na observação, a pupila ocular vai coincidir praticamente com a pupila de saída: demasiado perto, as pestanas batem na ocular (atenção ao rímel, que suja as oculares e custa a limpar); demasiado longe não poderemos ver todo o campo que as oculares abarcam. Por isso, se a pupila de saída for razoavelmente afastada das oculares ( > 16 mm) a observação será mais confortável e pode-se observar com óculos; no caso contrário, o olho não consegue aproximar-se o suficiente, mesmo que se encostem os óculos ao rebordo saliente das oculares, e não conseguiremos desfrutar da totalidade do campo visual. Em alguns aparelhos este rebordo é de borracha e pode ser rebatido, o que permite aproximar mais os olhos e facilita a observação com óculos. No entanto, a maioria dos binóculos permite uma margem de focagem suficiente ( 5 dioptrias) para compensar a graduação dos óculos, podendo-se observar sem eles excepto se tivermos uma graduação muito forte (que exceda o valor absoluto de 5 dioptrias) ou muito astigmatismo.

Nem sempre temos os dois olhos rigorosamente iguais. Por isso os fabricantes previram, além da focagem central (que permite focar simultaneamente dos dois lados), uma focagem suplementar do lado direito. Foca-se primeiro só para o olho esquerdo, actuando no botão de focagem central; depois, manipulando apenas o tambor da ocular direita, foca-se para o outro olho. Em alguns binóculos não existe focagem central e esta faz-se independentemente para cada um dos olhos. Os binóculos de "focagem permanente" e os de "focagem automática" não são recomendáveis.

A qualidade

Os parâmetros indicados permitem apreciar um binóculo, mas não dão indicações sobre a sua qualidade. A qualidade paga-se e um mau binóculo é uma falsa economia: cedo ou tarde teremos de comprar outro melhor, e o custo final acabará por ser superior ao de uma compra inicial acertada.

É evidente que não precisaremos de um binóculo de qualidade extraordinária e preço exorbitante para explorar o céu. O que convém é rejeitar firmemente os que são francamente maus. Actualmente consegue-se adquirir um aparelho satisfatório (por exemplo 7x50 ou 10x50) por cerca de 70 euros, ou pouco mais.

Num mau binóculo, são comuns os seguintes sintomas e características:

  • Não conseguimos fundir as duas imagens numa só, ou só o conseguimos à custa de esforço visual, mesmo depois de regular a distância interpupilar. Se isto acontecer, os eixos dos dois sistemas ópticos não são rigorosamente paralelos e/ou os sistemas ópticos não estão bem alinhados. Esta deficiência pode originar fadiga visual e dores de cabeça ao fim de alguns minutos de uso.
  • As imagens só são nítidas mesmo no centro do campo visual e ficam apreciavelmente desfocadas ainda longe dos bordos do campo.
  • As estrelas (que num bom binóculo se vêem como "pontos de luz") surgem com formas irregulares ou alongadas. A observação de estrelas constitui um teste mais exigente do que a simples contemplação de uma paisagem diurna.
  • Oculares demasiado pequenas. Se o diâmetro útil das oculares for inferior a cerca de 14 mm, a posição dos olhos relativamente ao binóculo torna-se mais crítica (inconveniente a evitar).


Num bom binóculo a observação faz-se em estado de descontracção visual, e quase nos esquecemos de que estamos a olhar através dele. A qualidade paga-se. Um binóculo 7x50 de razoável qualidade custará 80 a 130 euros. Um binóculo 20x80 já custará entre 350 e 450 euros.

Sistemas de prismas

Para produzir imagens direitas (de modo a permitir as observações terrestres) e para tornar os aparelhos mais compactos, todos os binóculos contêm sistemas inversores de prismas, que podem ser de dois tipos (Fig. 2):



Fig. 2- Sistema prismático de Porro (à esquerda) e de tecto (à direita). A linha tracejada representa, em ambos os binóculos, a marcha de um raio luminoso axial.


  • Prismas de Porro (nome do óptico alemão que idealizou este sistema inversor). Esta configuração é a melhor para as observações astronómicas, pois permite a máxima luminosidade da imagem e o mais amplo campo visual. Os binóculos com prismas de Porro reconhecem-se facilmente: o eixo de cada ocular não está no prolongamento do eixo da objectiva correspondente. Por isso, a distância entre os centros das objectivas é diferente (e geralmente maior) que a distância entre os centros das oculares.
  • Prismas de telhado, ou de tecto ("roof prisms"), solução mais cara e mais compacta que a anterior, embora geralmente as imagens sejam menos luminosas e o campo visual mais estreito. Os binóculos deste tipo reconhecem-se pelo facto de terem cada ocular no prolongamento do eixo da objectiva correspondente (a distância entre os centros da oculares é igual à distância entre os centros das objectivas).


Os pequenos binóculos de teatro (que não se recomendam para observações astronómicas) são os únicos que não possuem prismas porque as suas oculares são divergentes e dão directamente imagens direitas.

Considerações sobre a utilização dos binóculos

É essencial utilizar a correia de supensão fornecida com o binóculo, de modo a impedir as possíveis quedas deste, com consequências desastrosas tanto para a óptica como para a mecânica. Poderemos assim largar despreocupadamente o binóculo, ficando com as mãos livres para manusear (à luz vermelha atenuada) um roteiro do céu ou uma carta celeste. Para tirar o máximo proveito das observações astronómicas é necessário que os olhos do observador estejam adaptados à obscuridade, pois só assim conseguiremos detectar os alvos menos luminosos, na vizinhança do limiar da sensibilidade visual. Isto é válido tanto a olho nu como com qualquer instrumento de observação. Ao fim de dez minutos já se obtém uma adaptação satisfatória.

Alguns binóculos têm um revestimento exterior em borracha que lhes dá alguma protecção e torna a sua utilização mais cómoda. Há dois tipos de acessórios para adaptar os binóculos aos tripés: alguns binóculos possuem uma pequena tampa do lado das objectivas (no eixo da dobradiça que permite ajustar a distância entre as oculares), a qual depois de desenroscada põe à vista um furo roscado onde se aplica o adaptador; nos outros modelos, o veio da dobradiça é solidamente "agarrado" pelo adaptador. Em ambos os casos, o adaptador possui, por baixo, a rosca universal de adaptação ao tripé. A utilização de binóculos fixados em tripés é muito cómoda enquanto o binóculo não tiver de ser inclinado mais de 45º relativamente à horizontal. Para além desta inclinação os adaptadores habituais obrigam o observador a colocar-se em posições desconfortáveis. Pode-se contornar o problema fazendo um adaptador especial, mais ergonómico mas muito menos portátil. Por isso, na observação de regiões da esfera celeste próximas do zénite, é preferível que o observador dispense o tripé e se deite no solo, ou numa cadeira reclinável. O binóculo segura-se manualmente, apoiando as abas das oculares ou as mãos nas próprias sobrancelhas; se necessário pode-se apoiar os cotovelos em qualquer suporte firme. Consegue-se assim estabilizar bem o binóculo, desde que a sua ampliação não seja excessiva.

Nunca se deve observar com binóculos através dos vidros das janelas, pois estes não têm qualidade óptica suficiente, impedindo uma boa focagem.

Conclusão

Um dos maiores trunfos dos binóculos (em Astronomia) é a conjugação de um bom poder de captação de luz com um campo visual extenso. E isto é tão interessante que foram desenvolvidos telescópios especiais de acordo esta exigência: são os RFT (Richest Field Telescopes), nos quais a ampliação utilizada está próxima do mínimo compatível com a sua abertura. São estas as condições necessárias à observação de campos de estrelas, enxames estelares abertos, algumas nebulosas e galáxias. A função do binóculo, em Astronomia, não é a de "aumentar muito", mas sim a de permitir ver melhor, dando-nos uma panorâmica muito luminosa. Por isso, a galáxia da Andrómeda, vista com um binóculo, revela-se magnífica num céu escuro, mas ainda observável, mesmo por quem esteja numa cidade como Lisboa.

Só em poucos casos é que a ampliação do binóculo se torna um parâmetro importante (observação da Lua, de Júpiter e dos seus 4 maiores satélites, separação de estrelas duplas etc.). E mesmo assim devemos ser moderados. Um bom (e necessariamente caro) binóculo de 30x poderia ser uma alternativa a considerar para estas observações, mas não é. Neste caso, um pequeno telescópio de 60 a 100 mm de abertura e qualidade suficiente será mais barato e mais eficaz do que esse superbinóculo.

A bibliografia pormenoriza as possibilidades de observação com binóculos no âmbito da Astronomia, propriamente ditas, indicando também os alvos celestes mais interessantes.




Bibliografia:

[1] ALMEIDA, Guilherme de-Roteiro do Céu, Plátano Editora, Lisboa, 2004.
[2] ALMEIDA, Guilherme de-Telescópios, Plátano Editora, Lisboa, 2004.
[3] FERREIRA, Máximo e ALMEIDA, Guilherme de-Introdução à Astronomia e às Observações Astronómicas, Plátano Editora, 7ª edição, Lisboa, 2004.
[4] ALMEIDA, Guilherme e RÉ, Pedro-"Observar o Céu Profundo", Plátano Edições Técnicas, 2.ª edição, Lisboa, 2003.
[5] MOORE, Patrick-Exploring the Night Sky with Binoculars, Cambridge University Press, 1st edition reprinted, 1990 (3rd edition 1996).