Eclipses solares


Esta semana vamos falar de eclipses solares. Tal como descrevemos na primeira semana, desde os primórdios da Humanidade que os eclipses solares exerceram um tremendo fascínio sobre o Homem. Fosse por se pensar que os eclipses eram claras manifestações divinas ou, bastante mais tarde, quando já se conseguia entender alguma da mecânica associada a este fenómeno, por querer prever a sua ocorrência com a máxima precisão, há um facto indiscutível: um eclipse solar é um espectáculo fascinante e maravilhoso que a natureza nos proporciona e que nos marca para toda a vida quando temos a sorte de poder observá-lo.

Da mesma forma que os eclipses lunares, os eclipses solares podem ser parciais, totais ou ainda anulares, sendo que este último tipo só é válido para os eclipses solares. Um eclipse solar ocorre sempre na fase de lua nova, quando esta se interpõe entre o Sol e a Terra.

Referimos nas semanas anteriores que apenas podemos observar a ocorrência de eclipses solares totais e anulares devido a um “acaso” que teve origem durante a formação do sistema solar: possuindo a Lua um diâmetro cerca de 400 vezes menor que o diâmetro do Sol (a razão entre os diâmetros do Sol e da Lua é de 400,5), como é possível que o disco lunar oculte a totalidade do disco solar durante um eclipse solar total?

Encontrando-se o Sol a uma distância média de 149,6 milhões de quilómetros da Terra (uma Unidade Astronómica), a Lua, muito mais próxima de nós, alcança uma distância média de 384.400 km, o que resulta numa razão entre as distâncias médias da Terra ao Sol e à Lua de 389,1. A quase igualdade entre estas duas razões, a razão entre os diâmetros e a razão entre as distâncias médias, permite que, estando reunidas todas as condições de alinhamento entre o Sol, a Lua e a Terra, se observem eclipses solares totais. Estivéssemos nós ligeiramente mais perto do Sol, ou um pouco mais longe da Lua e já não observaríamos eclipses solares totais.


Figura 1 - Créditos: Manchu / Ciel et Espace e Association française d'astronomie, reproduzidas de HADDAD, Leila e CIROU, Alain, (1999), Soleil Noir - Le livre des éclipses, 1.ª ed., Seuil-AFA.
Existem variações na distância da Terra ao Sol, consoante o nosso planeta esteja na distância mínima, o periélio, ou seis meses depois, na distância máxima, o afélio. Da mesma forma e mais relevante para a ocorrência dos eclipses solares, também a Lua se encontra umas vezes mais próxima de nós, no perigeu, ou mais afastada, no apogeu. Estas variações das distâncias relativas, particularmente a distância da Lua à Terra, provocam uma alteração cíclica dos diâmetros aparentes dos dois astros.

Este facto contribui para que não existam dois eclipses absolutamente idênticos, sendo a totalidade mais ou menos prolongada em diferentes ocorrências. Umas vezes a Lua cobre totalmente o disco solar e observamos um eclipse solar total, outras vezes o diâmetro aparente da Lua é menor que o do Sol e ocorre um eclipse anular.

Os eclipses totais apenas são visíveis numa estreita faixa da Terra em que a sombra da Lua se projecta (esta faixa pode atingir em alguns eclipses cerca de 200 km de largura), nas zonas circundantes à sombra e que são abrangidas pela penumbra da Lua, acontece um eclipse parcial, cuja faixa pode atingir a largura de vários milhares de quilómetros (Fig. 1).



Imagem 1 - Créditos Wendy Carlos e Jonathan Kern


Quem tem a possibilidade de assistir a um eclipse total do Sol testemunhará um acontecimento que, certamente, o marcará para toda a vida. Escolher um local com muita gente, de preferência numa zona de interior onde possa observar os pássaros e outros animais, será sem dúvida uma experiência muito interessante. O escurecimento continuado e crescente antes do máximo do eclipse vai aumentando a apreensão e o nervosismo dos presentes e a confusão entre os animais. Com a chegada do cone de sombra, a temperatura descerá alguns graus e, de repente, o Sol desaparece para dar lugar a uma visão incomum de um disco negro rodeado de protuberâncias solares e “ornamentado” com a coroa solar (Imagem 1). Garanto-lhe por experiência própria que, enquanto durar a totalidade, todas as pessoas presentes manterão um absoluto silêncio, os cães uivarão uma só vez e deitar-se-ão no chão, os pássaros estarão sossegados nas árvores, como se aguardassem a noite. Os escassos minutos de totalidade parecerão uma eternidade sem fim, mergulhada na rara beleza do evento. Quando a Lua sai da frente do Sol e começa o percurso inverso, a euforia toma conta do local. Trocam-se promessas, beijos, abraços e os mais radicais abrem garrafas de champanhe e brindam à nova luz que lhes chega da nossa estrela. Os animais retomam a sua vida normal. É como se a Terra renascesse naquele local.


Figura 2 - Créditos: Manchu / Ciel et Espace e Association française d'astronomie, reproduzidas de HADDAD, Leila e CIROU, Alain, (1999), Soleil Noir - Le livre des éclipses, 1.ª ed., Seuil-AFA.
Como já referimos anteriormente torna-se necessário que a Lua esteja à distância certa para que o seu diâmetro aparente consiga mascarar o diâmetro aparente do Sol. Quando esta distância é máxima, no apogeu a 405.900 km da Terra, ela é suficiente para que a Lua pareça mais pequena que o Sol e, consequentemente, impedir que o nosso satélite mascare por completo o disco solar: acontece um igualmente belo eclipse anular do Sol (Fig. 2).

O cone de sombra da Lua mede, em média, 374.000 km de comprimento. Em função do maior afastamento da Lua no apogeu, o cone de sombra não chega a atingir a Terra, chegando até nós apenas um prolongamento da sua penumbra.

No próximo dia 3 de Outubro, parte de Portugal irá testemunhar um bonito eclipse anular. Será este o assunto que abordaremos na próxima semana, encerrando o tema do mês dedicado aos eclipses.