Pouco depois de assumirem corajosamente a responsabilidade pelo renascimento da física dos wormholes, Morris e Thorne aperceberam-se que podiam utilizá-los como máquinas do tempo. A aparente facilidade teórica com que se transforma um wormhole numa máquina do tempo é verdadeiramente assombrosa.

Visto que o tempo é incorporado na estrutura do espaço-tempo, é interessante notar que a Teoria da Relatividade Geral está contaminada por geometrias não-triviais que geram curvas temporais fechadas. Estas estranhas trajectórias descrevem caminhos no espaço-tempo que correspondem a um movimento para a frente no tempo local mas que terminam onde e quando começaram. Uma curva temporal fechada é, neste sentido, uma máquina do tempo, pois um viajante que percorre uma trajectória no espaço-tempo ao longo dessa curva depara-se consigo próprio a iniciar a viagem quando regressa ao acontecimento de partida. Mais geralmente, diz-se que um espaço-tempo que contem curvas temporais fechadas, localizadas numa região, tem uma máquina do tempo.

As curvas temporais fechadas violam, aparentemente, a causalidade, originando paradoxos associados às viagens no tempo e lançando um véu sobre a nossa compreensão da natureza do Tempo. Como a noção de causalidade é fundamental na construção das teorias físicas e na visão que os físicos têm da natureza, as viagens no tempo e seus paradoxos têm que ser tratados com muita cautela e delicadeza. A opinião generalizada é a de invocar as consequências estranhas dos paradoxos para negar a possibilidade de viajar no tempo, tal como outrora os paradoxos de Zenão foram utilizados para provar a impossibilidade do movimento.

Os paradoxos dividem-se em duas grandes categorias, nomeadamente, os paradoxos de consistência e os "loops" causais. Os paradoxos de consistência incluem, entre outros, o clássico paradoxo do avô. Imagine-se um viajante a regressar ao passado e a encontrar o seu avô. Alimentando tendências homicidas, o viajante no tempo assassina o avô, impedindo o nascimento do pai e, dessa forma, tornando o seu próprio nascimento impossível. Na realidade existem muitas versões do paradoxo do avô, limitadas, apenas pela imaginação de cada um. Os paradoxos de consistência ocorrem sempre que surge a possibilidade de alterar acontecimentos no passado.

Os paradoxos associados aos "loops" causais estão relacionados com informação ou objectos auto-existentes, aprisionados no espaço-tempo. Imagine-se um viajante que é lançado para o futuro. Este regressa com um manual que contém os planos de construção de uma máquina avançada. A máquina existe no futuro porque foi construída pelo viajante no passado. A sua construção foi possível no passado porque o viajante regressou com o manual do futuro. Ambas as partes consideradas em si mesmas são consistentes e o paradoxo só surge quando analisado como um todo. Perguntar-se-ia qual é a origem da máquina, pois aparentemente surge do nada. Há um manual incriado e, não obstante, existente no espaço-tempo, embora não se verifiquem violações de causalidade.

Soluções das equações de Einstein com curvas temporais fechadas

Existe uma grande variedade de soluções das equações de Einstein contendo curvas temporais fechadas, mas duas características parecem ressaltar: soluções com inclinação dos cones de luz devido a uma rotação em torno de um eixo com simetria cilíndrica; e soluções que violam as condições de energia da teoria da gravitação de Einstein, a Relatividade Geral.

É relativamente simples encontrar soluções das equações de Einstein, com uma rotação em torno de um eixo, que gerem curvas temporais temporais. Os exemplos mais conhecidos são:
  1. O espaço-tempo de van Stockum, que descreve um cilindro infinito de poeira que se encontra em rotação;
  2. Uma corda cósmica infinita, que também se encontra em rotação. Esta solução é análoga à de van Stockum;
  3. O universo de Godel, que descreve um universo, contendo poeira e com uma constante cosmológica, em rotação.

Também parece que muitas das soluções que violam as condições de energia geram curvas temporais fechadas. Os wormholes transitáveis, o warp drive de Alcubierre e o tubo de Krasnikov são os exemplos mais recentes. De seguida, apresentamos um tratamento simplificado na tranformação de um wormhole numa máquina do tempo.

Um wormhole como máquina do tempo

Apresentemos a seguinte experiência de pensamento (gedanken) para demonstrar a transformação de um wormhole numa máquina do tempo, utilizando a Relatividade Restrita. Suponhamos que uma das bocas do wormhole está em repouso na Terra, enquanto que a outra está no espaço interestelar, afastando-se da Terra a uma velocidade próxima da velocidade da luz. Apesar do movimento relativo das duas bocas, consideremos que o comprimento do wormhole, i.e., o comprimento do túnel, se mantém constante.

O comprimento do túnel do wormhole mantém-se fixo, enquanto que as duas bocas estão animadas com um movimento relativo no universo exterior. Cada figura representa um diagrama de mergulho de um wormhole. A parte inferior do universo desliza para a direita, enquanto que o wormhole na parte superior se mantém em repouso.

Logo, vistas do espaço exterior as bocas estão em referenciais diferentes; referenciais que têm uma velocidade relativa elevada. Atendendo à Relatividade Restrita, o tempo flui de um modo diferente nas duas bocas. Por outro lado, vistas através do interior do wormhole, as bocas estão em repouso relativo devido ao comprimento fixo do túnel, o que significa que o tempo flui à mesma taxa em ambas.

Verifica-se que o tempo está relacionado de um modo diferente medido através do túnel do wormhole e através do universo exterior com as duas bocas em movimento relativo. É com base nesta diferença que uma civilização infinitamente avançada poderá construir uma máquina do tempo. Para assentar ideias, consideremos outra experiência, análoga ao "paradoxo dos gémeos" da Relatividade Restrita. Suponhamos que obtemos um wormhole com um túnel extremamente curto, em que uma das bocas reside na sala A, enquanto que a outra se encontra na sala B. Por simplicidade, consideremos, inicialmente, que o tempo medido através do wormhole coincide com o tempo observado no seu exterior. Em seguida, um viajante efectua uma viagem com a respectiva boca do wormhole a bordo de uma nave espacial, partindo da sala B às 10h00 no dia 1 de Setembro de 2002.

Afastando-se da Terra a uma velocidade próxima da velocidade da luz durante seis horas, medidas no seu referencial próprio, o viajante inverte o sentido da viagem, aproximando-se novamente e aterra a nave na sala B doze horas após a sua partida. Observando-o através do wormhole durante toda a viagem, um observador concorda que o regresso da nave se efectua às 22h00 no dia 1 de Setembro de 2002. Agora, às 22h01, o observador afasta-se do wormhole e, ao entrar na sala B, depara-se com uma sala vazia. Se possuísse um telescópio potente, observaria a nave a afastar-se da Terra a uma elevada velocidade. A sua viagem medida na Terra, observada do exterior do wormhole, levaria dez anos.

Após dez anos, medidos no exterior do wormhole, a nave regressa às 10h00 do dia 1 de Setembro de 2012 e o viajante se encontra envelhecido apenas doze horas. Ao entrar na boca assente na nave e ao sair na outra boca na sala A, o observador depara-se consigo próprio dez anos mais novo. Isto é possível porque a boca que efectuou a viagem regressou às 22h00 no dia 1 de Setembro de 2002, no seu próprio referencial. Atendendo ao comprimento fixo do túnel, a outra boca encontra-se em repouso relativo e, consequentemente, observado através do wormhole esta também regista o mesmo tempo, 22h00 do dia 01/09/2002. O wormhole transformou-se numa máquina do tempo.

O Princípio de Auto-Consistência e a Conjectura de Protecção Cronológica

A Relatividade Geral tem sido uma teoria extremamente bem sucedida, com uma base experimental bem estabelecida, pelo menos no que respeita a campos gravitacionais fracos. As suas previsões vão desde a existência de buracos negros, passando pela radiação gravitacional, até aos modelos cosmológicos que prevêm o início do Universo, o Big-Bang.

No entanto, vimos que é relativamente simples encontrar soluções das equações de Einstein que gerem curvas temporais fechadas. Isto implica, considerando válida a Relatividade Geral, que devemos aceitar, pelo menos, a possibilidade de viagens no tempo na forma de curvas temporais fechadas. Uma reacção típica é excluir tal possibilidade com base nos paradoxos associados. Mas, existem soluções matemáticas consistentes, baseadas em processos físicos plausíveis. O que os paradoxos parecem indicar é que a informação local em espaços-tempos contendo curvas temporais fechadas se encontra restringida de formas pouco usuais.

Uma corrente de pensamento, proposta por Igor Novikov, conhecida como Princípio de Auto-Consistência, estipula que os acontecimentos ao longo de uma curva temporal fechada se influenciam uns aos outros de forma cíclica e auto-consistente. É importante notar que acontecimentos futuros podem influenciar, mas não alterar, acontecimentos passados. O Princípio de Auto-Consistência permite-nos construir soluções locais da Física, apenas se estas puderem ser estendidas a uma solução global consistente.

A Conjectura de Protecção Cronológica de Hawking constitui uma forma mais conservadora de lidar com os paradoxos. Hawking faz notar a forte evidência experimental em favor desta conjectura, com base no facto de "ainda não termos sido invadidos por hordas de turistas vindos do futuro". Utilizando a Teoria Quântica de Campo, Hawking demonstra que a conjectura permite a existência de wormholes transitáveis, mas proibe o aparecimento de curvas temporais fechadas. A transformação de um wormhole numa máquina do tempo resulta em enormes efeitos de polarização de vácuo, que destroem a sua estrutura interna.

Talvez uma eventual Teoria da Gravitação Quântica nos brinde com algumas respostas. Para já, conforme foi afirmado por Kip Thorne, só levando a Teoria da Relatividade Geral até às suas previsões extremas é que poderemos obter um conhecimento das suas limitações e, provavelmente, das formas de superá-las. Vistas as coisas desta perspectiva, as viagens no tempo, na forma de curvas temporais fechadas, constituem mais do que um pretexto para especulação teórica: são uma verdadeira ferramenta conceptual para sondar profundamente a Relatividade e extrair visões esclarecedoras.