Satélites da NASA detectam explosão de brilho numa protoestrela recém-nascida

2015-03-25

Imagens infravermelhas dos instrumentos do Kitt Peak National Observatory (esquerda) e do Telescópio Espacial Spitzer (fundo) documentam a explosão de HOPS 383, uma protoestrela no complexo de formação estelar de Órion. Crédito: E. Safron et al.; background: NASA/JPL-Caltech/Univ. of Toledo.
Usando dados provenientes de observatórios em órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
, incluindo o Telescópio Espacial Spitzer
Spitzer Space Telescope
O Telescópio Espacial Spitzer é um telescópio de infravermelhos colocado em órbita pela NASA a 25 de Agosto de 2003. Este telescópio, anteriormente designado por Space InfraRed Telescope Facility (SIRTF), foi re-baptizado em homenagem a Lyman Spitzer, Jr. (1914-1997), um dos grandes astrofísicos norte-americanos do século XX. Espera-se que este observatório espacial contribua grandemente em diversos campos da Astrofísica, como por exemplo na procura de anãs castanhas e planetas gigantes, na descoberta e estudo de discos protoplanetários à volta de estrelas próximas, no estudo de galáxias ultraluminosas no infravermelho e de núcleos de galáxias activas, e no estudo do Universo primitivo.
, da NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
, e de instalações terrestres, uma equipa internacional de astrónomos descobriu uma explosão de brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
numa estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
que se julga estar na fase inicial de desenvolvimento. Segundo os cientistas, a explosão revela que esta estrela excepcionalmente jovem, ou protoestrela, conhecida como HOPS 383, sofreu uma acumulação súbita de gás e poeira.

As estrelas formam-se com o colapso de fragmentos de nuvens de gás frio. À medida que a nuvem se contrai sob a sua própria gravidade, a sua região central torna-se mais densa e mais quente. No final deste processo, o fragmento em colapso é transformado numa protoestrela quente central rodeada por um disco de poeira aproximadamente igual em massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
, incorporado num invólucro denso de gás e poeira. Algo a que os astrónomos dão o nome de protoestrela de "Classe 0".

"HOPS 383 é a primeira explosão que observamos num objecto de Classe 0, e parece ser a mais jovem erupção protoestelar registada", disse William Fischer, do programa de pós-doutoramento do Goddard Space Flight Center da NASA, em Greenbelt, Maryland .

A fase de Classe 0 é de curta duração, cerca de 150 mil anos, e é considerada o estágio inicial de desenvolvimento de estrelas como o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
.

A protoestrela ainda não desenvolveu a capacidade de gerar energia própria das estrelas parecidas com o Sol, que fundem hidrogénio em hélio no seu núcleo. O brilho de uma protoestrela vem da energia térmica libertada pela sua contracção e pelo acumular de matéria do disco de gás e poeira que existe à sua volta. O disco poderá um dia desenvolver asteróides
asteróide
Um asteróide é um pequeno corpo rochoso que orbita em torno do Sol, com uma dimensão que pode ir desde os 100 m até aos 1000 km. A maioria dos asteróides encontra-se entre as órbitas de Marte e de Júpiter. Também são designados por planetas menores.
, cometas
cometa
Os cometas são pequenos corpos irregulares, compostos por gelos (de água e outros) e poeiras. Os cometas têm órbitas de grande excentricidade à volta do Sol. As estruturas mais importantes dos cometas são o núcleo, a cabeleira e as caudas.
e planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
.

Estes jovens sóis estão densamente envoltos em gás e poeira, por isso a luz visível
radiação visível
A radiação visível é a região do espectro electromagnético que os nossos olhos detectam, compreendida entre os comprimentos de onda de 350 e 700 nm (frequências entre 4,3 e 7,5x1014Hz). Os nossos olhos distinguem luz visível de frequências diferentes, desde a luz violeta (radiação com comprimentos de onda ~ 400 nm), até à luz vermelha (com comprimentos de onda ~ 700 nm), passando pelo azul, anil, verde, amarelo e laranja.
que emitem não consegue escapar. Mas a luz aquece a poeira em torno da protoestrela, que volta a irradiar a energia na forma de calor
calor
O calor é energia em trânsito entre dois corpos ou sistemas.
, detectável por instrumentos sensíveis aos infravermelhos
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
nos telescópios terrestres e nos satélites em órbita.

HOPS 383 fica na proximidade de NGC 1977, uma nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
da constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
de Órion, e faz parte do seu generoso complexo de formação estelar. Localizada a cerca de 1400 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
da Terra, a região é a mais activa "fábrica de estrelas" nas proximidades e abriga um tesouro de objectos estelares jovens
YSO (do inglês Young Stellar Object)
Designa-se por objecto estelar jovem qualquer estrela que tenha evoluído para além da fase de proto-estrela, mas que não seja ainda uma estrela da sequência principal. Ou seja, uma estrela que ainda não acumulou a totalidade da sua massa, mas cujo brilho já é produzido pelas reacções nucleares no interior do seu núcleo. As estrelas do tipo T Tauri e as estrelas do tipo Herbig Ae/Be são exemplos de objectos estelares jovens.
ainda envoltos nas suas nuvens de nascimento.

Uma equipa liderada por Thomas Megeath, da Universidade de Toledo, em Ohio, usou o Spitzer para identificar mais de 300 protoestrelas no complexo de Órion. Um projecto de seguimento, que usou o Observatório Espacial Herschel, da ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
, e ao qual foi dado o nome de HOPS (Herschel Orion Protostar Survey), estudou muitos desses objectos em maior detalhe.

A erupção de HOPS 383 foi identificada, pela primeira vez, pela astrónoma Emily Safron, em 2014, logo após a sua graduação pela Universidade de Toledo. Safron tinha acabado de completar a sua tese, sob a supervisão de Megeath e de Fischer, e que consistia na comparação do levantamento Spitzer Orion, já com uma década, com observações de 2010 do WISE (Wide-field Infrared Survey Explorer). Usando software para analisar os dados, Safron não tinha reparado em nada de novo. Mas depois de concluída a sua tese, decidiu dedicar um tempo extra à comparação a olho nu das imagens dos "objectos engraçados".

Foi quando percebeu a mudança dramática ocorrida em HOPS 383. "Esta bela explosão esteve o tempo todo à espreita na nossa amostra", disse ela.

O catálogo das observações de Safron incluiu dados do Spitzer em comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
de 3,6, 4,5 e 24 mícrones
mícron (µm)
O mícron (µm), ou micrómetro, é uma unidade de comprimento que corresponde à milésima parte do milímetro: 1µm = 10-3mm = 10-6 m.
e dados do WISE em 3,4, 4,6 e 22 mícrones. HOPS 383 está tão profundamente envolvida em poeira que não foi de todo observada antes da explosão no menor comprimento de onda do Spitzer, e um descuido numa versão do catálogo produzida antes do envolvimento de Safron mascarou o aumento nos comprimentos de onda mais longos. Como resultado, o seu software viu um aumento no brilho em apenas um dos três comprimentos de onda, o que não cumpria os critérios necessários para as alterações que ela estava à espera de encontrar.

Quando perceberam o que tinha acontecido, Safron, Fischer e os seus colegas reuniram dados adicionais do Spitzer, observações do Herschel e imagens de telescópios infravermelhos terrestres no Observatório Nacional de Kitt Peak
Kitt Peak National Observatory (KPNO)
O Observatório Nacional de Kitt Peak (KPNO) faz parte dos observatórios da NOAO e inclui diversos telescópios ópticos, de infravermelhos e um telescópio solar, além de operar, em consórcio, 19 telescópios ópticos e dois radiotelescópios. O KPNO situa-se a 90 km de Tucson, no Arizona (EUA).
, no Arizona, e no Atacama Pathfinder Experiment, no norte do Chile. Os resultados foram publicados na edição de 10 de Fevereiro do The Astrophysical Journal.

O primeiro sinal de aumento do brilho surge em dados do Spitzer a partir de 2006. Até 2008, o brilho de HOPS 383 em comprimento de onda de 24 mícrones havia aumentado 35 vezes. De acordo com os dados disponíveis mais recentes, a partir de 2012, a erupção não mostrou sinais de enfraquecer.

"Uma explosão que dura há tanto tempo exclui muitas possibilidades, e pensamos que o fenómeno em HOPS 383 se explica melhor por um aumento repentino na quantidade de gás que a protoestrela acumula por acreção
acreção
Designa-se por acreção a acumulação de matéria (gás e poeira) para um astro central, como por exemplo um buraco negro, uma estrela, uma galáxia, ou um planeta.
a partir do disco em seu redor", explicou Fischer.

Os cientistas suspeitam que as instabilidades no disco levam a episódios em que grandes quantidades de material flui para a protoestrela central. A estrela desenvolve um ponto quente extremo na região de impacto, que por sua vez aquece o disco, e ambos se iluminam de forma dramática.

A equipa continua a acompanhar a evolução de HOPS 383 e propôs a realização de novas observações com o SOFIA (Stratospheric Observatory for Infrared Astronomy), o maior telescópio aéreo do mundo.

Fonte da notícia: http://www.jpl.nasa.gov/news/news.php?feature=4518