Astrónomos criam modelo da Nebulosa de Homunculus para impressão em 3D

2014-07-09

Em cima: Um novo modelo da Nebulosa de Homunculus revela protuberâncias, valas, buracos e irregularidades na emissão de hidrogénio molecular. As protuberâncias surgem perto de uma espécie de saia de poeira observada em luz visível no centro da nebulosa, mas que não foi encontrada neste estudo, pelo que constituem estruturas diferentes. Crédito: NASA Goddard Space Flight Center. Inserções: NASA, ESA, Hubble SM4 ERO Team. Em baixo: Um modelo 3D impresso da Nebulosa de Homunculus é comparado a uma imagem do objecto do telescópio espacial Hubble. Crédito: NASA Goddard Space Flight Center/Ed Campion.
Os astrónomos criaram um modelo 3D detalhado da nuvem de detritos em expansão produzida na explosão de uma estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
condenada. O modelo pode ser reproduzido em casa por qualquer pessoa com uma impressora 3D. A equipa relatou as suas descobertas num artigo publicado a 8 de Julho na revista Monthly Notices da Royal Astronomical Society.

Em meados do século XIX, o enorme sistema binário Eta Carinae (η Car) passou por uma erupção que ejectou mais de 10 massas solares
massa solar
Massa solar é a quantidade de massa existente no Sol e, simultaneamente, a unidade na qual os astrónomos exprimem as massas das estrelas, nebulosas e galáxias. Uma massa solar é igual a 1,989x1030 kg.
de detritos, tornando-se na segunda estrela mais brilhante no céu. Os investigadores levaram a cabo novas e extensas observações para criar um modelo 3D detalhado dos restos da nuvem em expansão.

"O nosso modelo indica que esta vasta concha de gás e poeira tem uma origem mais complexa do que se supunha", disse Thomas Madura, do Goddard Space Flight Center da NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
, membro da equipa. "Pela primeira vez, temos evidências que sugerem que as intensas interacções entre as estrelas do binário central desempenharam um papel significativo na configuração da nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
que hoje vemos."

Eta Carinae está situada a 7500 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
de distância, na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
austral de Carina e é um dos sistemas binários com mais massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
que os astrónomos podem estudar em detalhe. A estrela mais pequena tem cerca de 30 vezes a massa do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
e pode chegar a ser um milhão de vezes mais luminosa. A estrela principal contém cerca de 90 massas solares e emite 5 milhões de vezes a energia do Sol. Ambas as estrelas estão destinadas a terminar as suas vidas em espectaculares explosões de supernovas
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
.

Entre 1838 e 1845, Eta Carinae passou por um período de variabilidade fora do comum, durante o qual chegou a ofuscar o brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
de Canopus, a segunda estrela mais brilhante no céu. Como parte do evento, a que os astrónomos chamam de a Grande Erupção, uma concha gasosa contendo entre 10 e 40 vezes a massa do Sol foi lançada no espaço. Este material forma uma nuvem com dois lobos, cheia de poeira, conhecida como a Nebulosa de Homunculus (homenzinho), que agora tem cerca de um ano-luz de comprimento e continua a expandir-se a mais de 2,1 milhões de quilómetros por hora.

Em Março de 2012, durante duas noites, a equipa observou a nebulosa em 92 áreas distintas e em comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
do infravermelho próximo
infravermelho próximo
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 5 mícrones. Esta banda permite observar astros ou fenómenos com temperaturas entre 740 e 5200 graus Kelvin.
, do visível e do ultravioleta
ultravioleta
O ultravioleta á a banda do espectro electromagnético que cobre a gama de comprimentos de onda entre os 91,2 e os 350 nanómetros. Esta radiação é largamente bloqueada pela atmosfera terrestre.
, usando para isso o Very Large Telescope
Very Large Telescope (VLT)
O Very Large Telescope é um observatório operado pelo Observatório Europeu do Sul (ESO) e localizado no Cerro Paranal, no deserto de Atacama, no Chile. O VLT é composto por 4 telescópios de 8,2 m de diâmetro que podem trabalhar simultaneamente, constituindo um interferómetro óptico, ou independentemente.
do Observatório Europeu do Sul
European Southern Observatory (ESO)
O Observatório Europeu do Sul é uma organização europeia de Astronomia para o estudo do céu austral fundada em 1962. Conta actualmente com a participação de 10 países europeus e ainda do Chile. Portugal tornou-se membro do ESO em 1 de Janeiro de 2001, no seguimento de um acordo de cooperação que durou cerca de 10 anos.
e o seu espectrógrafo X-Shooter, o que lhes permitiu elaborar o mapa mais completo até à data. Os investigadores usaram a informação espacial e de velocidade fornecida por estes dados para criarem o primeiro modelo 3D de alta resolução da Nebulosa de Homunculus.

O modelo foi desenvolvido usando apenas uma única linha de emissão de luz do infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
próximo emitida por gás de hidrogénio molecular. A luz característica de 2,12 mícrons desvia-se ligeiramente no comprimento de onda, dependendo da velocidade e da direcção do gás em expansão, permitindo à equipa sondar até mesmo porções da Nebulosa de Homunculus obscurecidas pela poeira que não estão viradas para a Terra.

"O passo seguinte foi processar tudo isto usando um software de modelação 3D que desenvolvi em colaboração com Nico Koning, da Universidade de Calgary, no Canadá. O programa chama-se simplesmente Shape e analisa e modela os movimentos e estrutura tridimensional de nebulosas de um modo que pode ser directamente comparado com as observações", disse Wolfgang Steffen, da Universidade Autónoma Nacional do México e principal autor do artigo.

Um vídeo do novo modelo da Nebulosa de Homunculus pode ser visto aqui: https://www.youtube.com/watch?v=YHGMJNqqXnQ

O novo modelo de configuração confirma várias características identificadas por estudos anteriores, incluindo buracos pronunciados localizados nas extremidades de cada lobo, e a ausência de qualquer emissão extensa de hidrogénio molecular a partir de algo semelhante a uma saia de poeira e que se observa em luz visível
radiação visível
A radiação visível é a região do espectro electromagnético que os nossos olhos detectam, compreendida entre os comprimentos de onda de 350 e 700 nm (frequências entre 4,3 e 7,5x1014Hz). Os nossos olhos distinguem luz visível de frequências diferentes, desde a luz violeta (radiação com comprimentos de onda ~ 400 nm), até à luz vermelha (com comprimentos de onda ~ 700 nm), passando pelo azul, anil, verde, amarelo e laranja.
perto do centro da nebulosa. As novas características incluem curiosas protuberâncias com a forma de braços que emanam de cada lobo perto da saia de poeira; valas vastas e profundas curvando ao longo de cada lobo; sulcos irregulares no lado aposto ao visto da Terra.

"Uma das questões que nos propusemos responder com este estudo é se a nebulosa contém qualquer marca da natureza binária da estrela, uma vez que os esforços realizados anteriormente para explicar a sua forma assumiram que ambos os lobos eram mais ou menos idênticos e simétricos em torno do seu eixo longitudinal", explicou José Groh, da Universidade de Genebra, membro da equipa. "As novas características sugerem fortemente que as interacções entre as estrelas de Eta Carinae ajudaram a moldar a nebulosa."

A cada 5,5 anos, quando as suas órbitas
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
as conduzem à maior aproximação, as brilhantes estrelas de Eta Carinae estão a uma distancia semelhante à do Sol a Marte
Marte
Marte é o quarto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. É o último dos chamados planetas interiores. O seu diâmetro é cerca de 50% mais pequeno do que o da Terra e possui uma superfície avermelhada, sendo também conhecido como planeta vermelho.
. Ambas as estrelas lançam poderosos jorros de gás, os ventos estelares, que interagem de forma mais dramática durante a aproximação. O vento mais veloz da estrela menor escava então um túnel através do vento mais denso da sua companheira. O ângulo da cavidade aberta aproxima-se ao da extensão das valas (130 graus) e ao ângulo entre as saliências com a forma de braços (110 graus). Isto indica que a forma da nebulosa continua provavelmente a acarretar a marca da maior aproximação do binário, por volta da época da Grande Erupção.

Uma vez desenvolvido o modelo da Nebulosa de Homunculus, os investigadores deram um passo em frente, convertendo-o para um formato que pode ser usado por impressoras 3D e disponibilizando o respectivo ficheiro juntamente com o artigo publicado.

"Agora, qualquer pessoa com acesso a uma impressora 3D pode produzir a sua própria versão deste objecto incrível", disse Theodore Gull, também do Goddard e co-autor do artigo. "Os modelos 3D-impressos são uma ferramenta de visualização fantástica para qualquer pessoa interessada em astronomia, e são particularmente valiosos para os cegos, que agora serão capazes de comparar imagens astronómicas em relevo como representações cientificamente exactas da realidade."

O modelo 3D pode ser obtido via Goddard Space Flight Center, aqui: http://svs.gsfc.nasa.gov/vis/a010000/a011500/a011568/
Ou através da notícia na página da Royal Astronomical Society: http://www.ras.org.uk/news-and-press/2483-astronomers-bring-the-third-dimension-to-a-doomed-star-s-outburst

Fonte da notícia: http://www.ras.org.uk/news-and-press/2483-astronomers-bring-the-third-dimension-to-a-doomed-star-s-outburst