Plutão é mais frio do que deveria

2006-01-06

Ilustração de Plutão com a sua lua Caronte, vistos a partir de um dos novos e recentemente descobertos candidatos a satélites. Crédito: David A. Aguilar (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics).
Investigadores do Centro Harvard-Smithsonian para a Astrofísica confirmaram um facto do qual já havia muitas suspeitas: Plutão
Plutão
Plutão é, na maior parte do tempo, o nono e último planeta do Sistema Solar a contar do Sol, mas devido à sua órbita excêntrica, durante algum tempo aproxima-se mais do Sol do que Neptuno. É um planeta singular em muitos aspectos: é o mais pequeno (cerca de 1/500 o diâmetro da Terra), tem uma composição muito rica em gelos, possui a órbita mais excêntrica e inclinada em relação à eclíptica, e tem, tal como Úrano, o seu eixo de rotação muito inclinado (122º) em relação à eclíptica.
é mais frio do que deveria.
Plutão e a sua lua Caronte encontram-se muito distantes de nós. Plutão dista do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
trinta vezes mais do que a Terra e, como tal, a luz do dia neste mundo tão longínquo é semelhante a um escuro crepúsculo terrestre. A sua temperatura varia significativamente durante o curso da sua órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
, já que a sua distância ao Sol pode situar-se entre as 30 e as 50 unidades astronómicas
unidade astronómica (UA)
Unidade de distância, definida como a distância média entre a Terra e o Sol, que corresponde a 149 597 870 km, ou 8,3 minutos-luz.
. Julga-se que, à medida que Plutão se afasta do Sol, a sua fina atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
congela e cai sobre a superfície sob a forma de gelo.

Telescópios como os do Observatório W. M. Keck
W. M. Keck Observatory
O Observatório W. M. Keck é operado pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e pela NASA, e encontra-se localizado em Mauna Kea, no Havai. O observatório é constituído por dois telescópios gémeos de 10 metros, o Keck I e o Keck II.
, no Havai, e o Telescópio Espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
) recolheram a luz solar reflectida pelo planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
e os dados sugeriam que a sua superfície podia ser mais fria do que deveria ser, o mesmo não acontecendo com Caronte. No entanto, nenhum telescópio tinha ainda conseguido distinguir satisfatoriamente as emissões térmicas dos dois corpos. A proximidade entre o planeta e a sua lua representava um grande desafio, uma vez que nunca estão afastados mais do que 0,9 segundos de arco
segundo de arco (")
O segundo de arco (") é uma unidade de medida de ângulos, ou arcos de circunferência, correspondente a 1/60 de minuto de arco, ou seja, 1/3600 de grau.
.

Agora, pela primeira vez, os astrónomos do Centro Harvard-Smithsonian para a Astrofísica, utilizando o Submillimeter Array - SMA, em Mauna Kea, no Havai, conseguiram obter medições directas da emissão térmica dos dois corpos celestes. Concluíram que Plutão é realmente mais frio do que se esperava, mais frio ainda que Caronte. Plutão parece ser um exemplo dinâmico de aquilo a que se pode chamar um planeta com um anti-efeito de estufa.

Durante as observações, o SMA utilizou a sua configuração mais extensa para obter dados de interferometria
interferometria
A interferometria é uma técnica de observação baseada em padrões de interferência causados pela combinação de ondas electromagnéticas: quando duas ondas estão em fase, o sinal é mais forte e diz-se que a interferência é construtiva; quando as duas ondas estão exactamente fora de fase, a interferência é destrutiva e não há sinal.
de alta resolução, de forma a que fosse possível separar as leituras térmicas de Plutão e de Caronte. O SMA descobriu que a temperatura da superfície coberta de gelo de Plutão é de 43 graus Kelvin, em vez dos 53 graus Kelvin esperados, que determinam a temperatura de Caronte. Os resultados encaixam perfeitamente no modelo corrente, que considera que a baixa temperatura de Plutão é provocada pelo equilíbrio entre a sua superfície gelada e a sua fina atmosfera de azoto. O fenómeno pode ser comparado à forma como a evaporação de um líquido, como o suor, pode arrefecer a nossa pele. A luz solar que atinge Plutão serve para converter algum azoto gelado em gás, mas não para aquecer a sua superfície.

Os cientistas continuam a manter em aberto a discussão sobre a classificação de Plutão, nomeadamente se deve ser considerado um planeta ou um foragido da Cintura de Kuiper
Cintura de Kuiper
A Cintura de Kuiper é uma região em forma de disco, localizada depois de Neptuno, entre 30 e 50 UA do Sol. É constituída por muitos pequenos corpos gelados, restos da formação do Sistema Solar, e é a fonte dos cometas de curto-período. O primeiro objecto da Cintura de Kuiper, 1992QB1, com 240 km de diâmetro, só foi descoberto em 1992, mas desde então já se conhecem centenas de objectos da Cintura de Kuiper (KBO, do inglês Kuiper Belt Object). Há astrónomos que consideram Plutão, e a sua lua Caronte, objectos da Cintura de Kuiper.
. Mas, seja como for, Plutão e a sua lua Caronte guardam certamente alguns segredos sobre a história primitiva da formação dos planetas. Caronte tem praticamente metade do diâmetros de Plutão e ambos formam um par que é único no nosso Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
. Saber como ficaram juntos, é ainda um mistério.

Os resultados desta pesquisa serão apresentados no 207º encontro da American Astronomical Society, em Washington, DC.

Fonte da notícia: http://www.cfa.harvard.edu/press/pr0601.html